A força do leite e companhia

28/07/2012 10:59

Tomar leite é um grande negócio quando se é pequeno. Os bebês fazem a coisa certa e se empanturram do alimento — se até os 6 meses a opção disponível no cardápio for a versão materna, tanto melhor para eles. O problema é quando, crescidinha, a criança “decide” que não quer mais a bebida. Geralmente isso acontece quando o hábito de beber leite não é estimulado desde a mais tenra infância, logo que o pequeno dá adeus ao peito da mãe ou à mamadeira.

Já quando a família incentiva a mania, os ossos agradecem. “É durante a infância e a adolescência que ocorre um maior depósito de massa óssea no esqueleto”, afirma Fernanda Cobayashi, nutricionista da Universidade Federal de São Paulo, a Unifesp. E para isso é preciso matéria-prima, ou seja, cálcio disponível no organismo. Mais do que um investimento a curto prazo, capaz de garantir o crescimento da criança, fornecer o mineral é formar uma poupança capaz de afastar o risco de osteoporose e fraturas na idade madura, ou seja, lá em um futuro longínquo.

Quando se avalia o consumo de lácteos em geral, o Brasil ocupa uma enfraquecida posição de lanterninha. Enquanto a Organização Mundial da Saúde recomenda que cada cidadão mirim do planeta consuma pelo menos 175 litros desses produtos por ano, a média brasileira fica em 130 litros por criança. Um pequeno dinamarquês, enquanto isso, sorve 405 litros de leite e outras bebidas lácteas; um francesinho não fica por muito menos, tomando 399 litros em média ao longo de um ano; uma criança alemã se esbalda com 375 litros anuais.

A indústria brasileira, justiça se faça, tenta compensar essa desafasagem. Está virando mania nacional suprir os produtos lácteos com mais e mais cálcio, sem contar várias vitaminas, para facilitar o alcance das metas para a ingestão de nutrientes na garotada do país.

Existem casos em que a criança não suporta leite ao pé da letra – mas aí estamos falando em alergia (veja o quadro à direita). A maioria, porém, precisa mesmo é se acostumar com a idéia — para não dizer com o sabor. Vamos ser claros como leite puro: as melhores fontes de cálcio de que se tem notícia são mesmo os produtos lácteos, não só o leite em si, mas também os queijos, iogurtes, pudins... “O leite de vaca é, de longe, o alimento mais rico nesse mineral, com 1,2 grama dele por litro. E, diga-se, a molécula de cálcio que ele fornece é de ótima absorção”, nota Fernanda Cobayashi. Como uma criança a partir dos 8 anos necessita de 1,3 grama do mineral todo santo dia para o seu desenvolvimento, o cálculo é simples: ela vai precisar de cada gota de todo esse leite, o suficiente para encher quatro copos ou xícaras grandes, a fim de obter um aporte adequado. Antes dos 8 anos, a recomendação é de 800 miligramas do mineral, o que dá uns três copos.

Será que pode substituir a bebida por um de seus derivados? Pode, mas o ideal é fazer apenas uma troca parcial. Ou seja, não substituir toda a bebida indicada conforme a idade por queijos, iogurtes e afins. É a nutricionista Adriana Servilha Gandolfo, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo, que dá justificativa: “Para manter a equivalência nutricional, seria preciso ingerir grandes quantidades desses outros alimentos, o que pode aumentar demais o valor calórico da dieta e elevar as chances de a criança ganhar peso em excesso”.

Ruth Lobato Matsumoto, nutricionista da Universidade de São Paulo, tem mais uma preocupação. Segundo ela, os substitutos do leite eleitos na infância até fornecem um bocado de cálcio, mas são sempre muito doces. “Existe o risco de, na tentativa de fornecer todo o cálcio àquela criança que se recusa a tomar leite, você viciar seu paladar em alimentos açucarados quando esse sentido ainda está em formação.” Para ela, os produtos lácteos industrializados, feitos para agradar a criançada, devem ser oferecidos com parcimônia, de preferência só na hora do lanche.




De olho na balança — porque a obesidade infantil é mesmo um problema sério — Adriana Gandolfo dá outra recomendação aos pais: levar em conta o teor de gordura, especialmente se a criança estiver gorducha. Compare: o leite integral contém pelo menos 3,5% de gordura; no semidesnatado essa proporção é de 1,5% a 1,8%. No tipo desnatado, fica em torno de 0,3%. Em termos de proteínas e do badaladíssimo cálcio, porém, as diferenças são mínimas. Assim, às vezes vale a pena trocar o leite gordo pelo magro.

Versões fortificadas

Outro ponto a observar é se o leite é forticado com vitaminas e minerais — o que pode acontecer com certas versões em pó e de tipos longa vida. Isso é fundamental? Em matéria de leite, se a gente pensar no papel do alimento como grande fornecedor de cálcio, pode não fazer tanta diferença, especialmente se a criança tem uma dieta superbalanceada. Agora, que isso dá uma força em um mundo onde é tão difícil encontrar uma criança com essa tal dieta equilibradérrima, ah, isso é inegável.

Uma porção para cada idade

Faixa etária Cálcio(mg)
Infância  
0 – 6 m 210
7 – 12 m 270
Crianças  
1 – 3 a 500
4 – 8 a 800
Homens  
9 – 13 a 1 300
14 – 18 a 1 300
19 – 30 a 1 000
Mulheres  
9 – 13 a 1 300
14 – 18 a 1 300
19 – 30 a 1 000

 

Em caso de alergia

Em algumas crianças, o organismo reage violentamente à presença da caseína, uma proteína do leite de vaca. Seu sistema imunológico a recebe como uma instrusa e daí faz um escarcéu daqueles, que resulta em crises de diarréia, déficit de crescimento, reações de pele e problemas respiratórios — sim, em última instância, até os pulmões podem terminar vítimas desse grande mal-entendido. Aí não tem jeito. É preciso restringir terminantemente o consumo de leite e de todos os seus derivados. O problema afeta cerca de 2,5% dos pequenos menores de 3 anos. Eles, então, precisam se valer de suplementos de cálcio sob a orientação do pediatria.

No entanto, não confunda alergia com o que os médicos chamam de tolerância restritiva, porque aí o problema é diferente. Por alguma razão, provavelmente de origem genética, o organismo da criança não produz a enzima lactase, ao menos em doses suficientes. Sintetizada no intestino, ela é encarregada de quebrar as moléculas de lactose, o açúcar do leite. Quando está em falta, basta a criança engolir um pouco de leite para sentir muita dor de barriga, que pode vir acompanhada de vômito, diarréia ou, ao contrário, prisão de ventre. Mas, em casos assim — ainda bem! —, só o leite sai de cena. Seus derivados, como queijos e iogurtes, têm um nadica de lactose e, para essa meninada intolerante, não fazem mal nenhum.

Quantidade de cálcio nos alimentos lácteos

 

Alimentos Porção Cálcio(mg)
Leite integral 1 xícara chá 290
Leite semidesnatado 1 xícara chá 297
Leite desnatado 1 xícara chá 302
Queijo branco Fatia (30 g) 205
Queijo mussarela Fatia (20 g) 120
Requeijão Colher sopa rasa (15 g) 85
Iogurte natural Pote (200 g) 228
Catupiry 1 porção (30 g) 38
Queijo petit suisse 1 pote (45 g) 108